Recursos Humanos
O direito, segundo a tônica da moderna teoria jurídica, é compreendido como um complexo sistema, dinamicamente organizado e composto de elementos que realizam funções específicas, sendo apontado como a espinha dorsal da sociedade, fazendo com que o Estado, que é uma organização inserida na sociedade, tenha o dever de atuar para garantir e efetivar os direitos conquistados, sem se olvidar da constante possibilidade de abertura para a construção de novos direitos. Essa possibilidade se justifica pelo simples fato de que esse sistema não conduz a um raciocínio de fechamento, uma vez que os diversos elementos se mantêm em constante e permanente interação e diálogo entre si, sobretudo em virtude da adoção de cláusulas abertas e princípios.
Dessa forma tem-se que a base para construção do direito e consequentemente de todo e qualquer ordenamento jurídico passa-se necessariamente pelos princípios, pois é através deles e por eles que se constroem os regramentos de um sistema, assim como de um microssistema, que é um disciplinamento setorial de determinada matéria, com diretrizes e princípios próprios, conferindo identidade própria, como é o caso do direito eleitoral.
No Direito Eleitoral diversos foram os princípios que serviram de alicerce a um conjunto de juízos utilizados na formatação de seus pressupostos necessários. A título de exemplo podemos mencionar os seguintes princípios: democracia, democracia partidária, poder soberano, republicano, federativo, sufrágio universal, legitimidade, moralidade, probidade, merecendo maiores destaques o do Estado Democrático de Direito e o da igualdade ou isonomia.
O Estado Democrático de Direito, na qual se constitui a República Federativa do Brasil, a teor do art. 1º da Constituição Política, significa que as estruturas estatais devem observar os critérios do Direito em contrapartida da força, da prepotência ou do arbítrio, permitindo que os cidadãos participem do Estado como seus artífices e principais destinatários de suas emanações, sendo certo que nessa forma de Estado os direitos políticos encontram-se em lugar privilegiado, pois a Carta da República os consagraram como direitos fundamentais da sociedade. A igualdade ou isonomia, por sua vez, constitui especial relevo no Direito Eleitoral, por reger diversas situações. Assinala José Jairo Gomes (2010, p.50) que basta “[...] lembrar que os concorrentes a cargos político-eletivos devem contar com as mesmas oportunidades, ressalvadas as situações previstas em lei – que têm em vista o resguardo de outros valores – e as naturais desigualdades que entre eles se verificam”.
O regramento sobre as causas de inelegibilidades - erigidas notadamente sob o princípio da igualdade do direito eleitoral - é uma das discussões mais intensas na doutrina e jurisprudência eleitoral, em virtude da repercussão na vida dos candidatos, pois apesar de todo brasileiro poder, em tese, influenciar na formação do governo, desde que esteja no exercício dos seus direitos políticos é certo, todavia, que há fatos e circunstâncias que retiram dos cidadãos a possibilidade de serem eleitos, através de regras restritivas que lhe negam o direito de representarem o povo no Poder. Assim, para que uma candidatura possa ser deferida, necessário que o interessado reúna todas as condições de elegibilidade, como também não incorrer em nenhuma das causas de inelegibilidades, insertas na Constituição ou em Lei Complementar. Por isso que Edson de Resende Castro (2010, p.132) afirma que “[...] a presença das primeiras e a ausência das segundas leva à elegibilidade, ou seja, ao direito de ir às urnas”.
Especificamente, no que tange às inelegibilidades em virtude do exercício de determinadas funções, que são incompatíveis com a condição de candidato, a Constituição da República estabeleceu a possibilidade de Lei Complementar fixar prazos e regulamentar essa matéria.
Editou-se, portanto, a Lei Complementar n.º 64/90 – que regulamentou o artigo 14, § 9º, da CR/88 -, que se preocupou em evitar que aquele que esteja exercendo determinadas funções previstas na lei se apresente em situação de maiores oportunidades diante dos demais concorrentes, ocasionando desequilíbrio do processo. Por isso que se exigiu nessas circunstâncias a desincompatibilização das funções públicas, que consiste no afastamento do cargo, emprego ou função públicos, de maneira a viabilizar a candidatura, desde que observado o prazo fixado no ordenamento jurídico, podendo esse afastamento ocorrer por simples licença (para os funcionários públicos efetivos), por exoneração (para os servidores ocupantes de cargo em comissão) e por renúncia (para os titulares de mandato eletivo).
No entanto, por força da Emenda Constitucional de n.º16/97, que alterou o § 5º, do art. 14, da CR/88, os chefes do Poder Executivo podem permanecer em seus cargos para disputar a reeleição, exigindo-se a desincompatibilização apenas para o caso de disputarem outro cargo.
Assim, se um Prefeito visa disputar, p.ex., o cargo de Deputado deverá afastar-se de sua função pelo menos 6 (seis) meses antes da data da eleição, pois dessa forma resolve-se o problema da incompatibilidade e, via de consequência, da inelegibilidade. Utilizando desse raciocínio, prefeitos municipais já por dois mandatos e que ainda pretendiam permanecer no poder, apesar da Constituição permitir apenas uma reeleição, se desincompatibilizavam de seus cargos para disputarem o cargo de prefeito de outro município, independentemente se vizinho ou não, sendo essa situação permitida pela jurisprudência eleitoral, que entendia essa manobra como candidatura a outro cargo.
Felizmente, desde 2008 o TSE, através do Respe n. 32.507, passou a entender que esses “prefeitos itinerantes” não podem disputar um terceiro mandato, ainda que em município diverso, sob o fundamento de que o princípio republicano não permite a perpetuação no poder.
A propósito:
RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. MUDANÇA DE DOMICÍLIO ELEITORAL. “PREFEITOS ITINERANTES”. EXERCÍCIO CONSECUTIVO DE MAIS DE DOIS MANDATOS DE CHEFIA DO EXECUTIVO EM MUNICÍPIOS DIFERENTES. IMPOSSIBILIDADE. INDEVIDA PERPETUAÇÃO NO PODER. OFENSA AOS §§ 5º E 6º DO ART. 14 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. NOVA JURISPRUDÊNCIA DO TSE. Não se pode, mediante a prática de ato normalmente lícito (mudança de domicílio eleitoral), alcançar finalidades incompatíveis com a Constituição: a perpetuação no poder e o apoderamento de unidades federadas para a formação de clãs políticos ou hegemonias familiares. O princípio republicano está a inspirar a seguinte interpretação basilar dos §§ 5º e 6º do art. 14 da Carta Política: somente é possível eleger-se para o cargo de “prefeito municipal” por duas consecutivas. Após isso, apenas permite-se, respeitando o prazo de desincompatibilização de 6 meses, a candidatura a “outro cargo”, ou seja, a mandato legislativo, ou aos cargos de Governador de Estado ou de Presidente da República; não mais de Prefeito Municipal, portanto. Nova orientação jurisprudencial do Tribunal Superior Eleitoral, firmada no Respe 32.507. (TSE, Respe n. 32.539, Rel. Min. Carlos Ayres Britto).
Importante registrar que os prazos da desincompatibilização variam de acordo com o risco de se atentar contra a isonomia de oportunidades entre os candidatos, estabelecendo a Carta Política e a Lei Complementar n. 64/90 o período compreendido entre três a seis meses de afastamento, observando sempre que a inelegibilidade só existe se o candidato exercer função tida como incompatível no território da disputa, vale dizer, a legislação não exige a desincompatibilização de um servidor público do município de Belo Horizonte que pretende se candidatar ao cargo de vereador no município de Formiga, diante da improvável interferência no eleitorado do local da eleição, em decorrência do cargo por ele ocupado.
Ademais, insta consignar que o prazo de afastamento dos servidores públicos, por serem remunerados, é sempre de 3 meses, independentemente do cargo eletivo em disputa, mesmo quando a hipótese se referir àquela prevista no art. 1º, VII, da LC n. 64/90, que prevê o prazo de desincompatibilização de 6 meses para a Câmara Municipal, com exceção dos servidores do fisco. Isso se justifica porque interpretação em contrário atentaria contra os princípios regentes da Administração Pública, pois com a redução do prazo para 3 meses, o servidor já terá sido escolhido em convenção, evitando, assim, o recebimento de licença remunerada, sem qualquer causa justificadora legítima ou razoável.
Portanto, caso um servidor público tenha interesse de se candidatar nas próximas eleições deverá se atentar para o prazo de desincompatibilização, sob pena de ter sua candidatura impugnada. No entanto, importante ressaltar que esse tipo de inelegibilidade, por se tratar de hipótese infraconstitucional, se submete ao instituto da preclusão se não for arguida por ocasião do registro da candidatura. Assim, se essa incompatibilidade não for suscitada no momento oportuno não mais poderá ser feita em outra ocasião. Por isso que a impugnação em tela, que poderá ser feita por qualquer candidato, partido político, coligação ou pelo Ministério Público, deverá ser utilizada com presteza, evitando que candidaturas ilegais possam ser registradas, a despeito do comando previsto na Lei Complementar de regência.
De mais a mais, sendo o Ministério Público Eleitoral uma instituição que tem como função jurisdicional, dentre outras, a defesa do regime democrático, certo é que seus membros têm legitimidade para oficiar em todos os processos e procedimentos em que se apresente a matéria eleitoral, intervindo tanto como autor ou como custos legis, ou seja, como fiscal da lei. Assim, qualquer interessado que porventura tenha conhecimento de alguma irregularidade no pleito eleitoral poderá se direcionar ao Ministério Público noticiando os fatos, para que o Promotor Eleitoral possa tomar as providências pertinentes, visando, sempre, a lisura e a igualdade de oportunidades na eleição.
Por fim, anotamos que o objetivo deste artigo foi fazer um breve panorama da inelegibilidade que tem como causa determinante o exercício de certas funções, que a lei infraconstitucional entende como incompatíveis com a condição de candidato, oportunidade em que demonstramos que essa situação se justifica pelos princípios norteadores do Direito Eleitoral, notadamente os do Estado Democrático de Direito e o da igualdade ou isonomia, garantindo, assim, aos cidadãos a liberdade e a plena participação na escolha de seus governantes, de sorte que a disputa eleitoral transcorra com as mesmas oportunidades entre os candidatos, pois, caso isso não ocorra, os legitimados eleitorais, dentre eles o Ministério Público, deverá provocar a Justiça Eleitoral para restabelecer o sistema jurídico. E não poderia ser de outra forma, pois apesar dos princípios serem infringidos até mesmo com certa frequência, essa situação não deve perdurar, até porque, como lecionado por José Jairo Gomes (2010, p.29), a infringência aos princípios [...] “é muito mais grave que a transgressão de uma regra positivada, pois a desatenção a um princípio implica ofensa não apenas a específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos, aos fundamentos em que a norma ou o próprio ordenamento encontram-se assentado”.omplexo sistema, dinamicamente organizado e composto de elementos que realizam funções específicas, sendo apontado como a espinha dorsal da sociedade, fazendo com que o Estado, que é uma organização inserida na sociedade, tenha o dever de atuar para garantir e efetivar os direitos conquistados, sem se olvidar da constante possibilidade de abertura para a construção de novos direitos. Essa possibilidade se justifica pelo simples fato de que esse sistema não conduz a um raciocínio de fechamento, uma vez que os diversos elementos se mantêm em constante e permanente interação e diálogo entre si, sobretudo em virtude da adoção de cláusulas abertas e princípios.
Dessa forma tem-se que a base para construção do direito e consequentemente de todo e qualquer ordenamento jurídico passa-se necessariamente pelos princípios, pois é através deles e por eles que se constroem os regramentos de um sistema, assim como de um microssistema, que é um disciplinamento setorial de determinada matéria, com diretrizes e princípios próprios, conferindo identidade própria, como é o caso do direito eleitoral.
No Direito Eleitoral diversos foram os princípios que serviram de alicerce a um conjunto de juízos utilizados na formatação de seus pressupostos necessários. A título de exemplo podemos mencionar os seguintes princípios: democracia, democracia partidária, poder soberano, republicano, federativo, sufrágio universal, legitimidade, moralidade, probidade, merecendo maiores destaques o do Estado Democrático de Direito e o da igualdade ou isonomia.
O Estado Democrático de Direito, na qual se constitui a República Federativa do Brasil, a teor do art. 1º da Constituição Política, significa que as estruturas estatais devem observar os critérios do Direito em contrapartida da força, da prepotência ou do arbítrio, permitindo que os cidadãos participem do Estado como seus artífices e principais destinatários de suas emanações, sendo certo que nessa forma de Estado os direitos políticos encontram-se em lugar privilegiado, pois a Carta da República os consagraram como direitos fundamentais da sociedade. A igualdade ou isonomia, por sua vez, constitui especial relevo no Direito Eleitoral, por reger diversas situações. Assinala José Jairo Gomes (2010, p.50) que basta “[...] lembrar que os concorrentes a cargos político-eletivos devem contar com as mesmas oportunidades, ressalvadas as situações previstas em lei – que têm em vista o resguardo de outros valores – e as naturais desigualdades que entre eles se verificam”.
O regramento sobre as causas de inelegibilidades - erigidas notadamente sob o princípio da igualdade do direito eleitoral - é uma das discussões mais intensas na doutrina e jurisprudência eleitoral, em virtude da repercussão na vida dos candidatos, pois apesar de todo brasileiro poder, em tese, influenciar na formação do governo, desde que esteja no exercício dos seus direitos políticos é certo, todavia, que há fatos e circunstâncias que retiram dos cidadãos a possibilidade de serem eleitos, através de regras restritivas que lhe negam o direito de representarem o povo no Poder. Assim, para que uma candidatura possa ser deferida, necessário que o interessado reúna todas as condições de elegibilidade, como também não incorrer em nenhuma das causas de inelegibilidades, insertas na Constituição ou em Lei Complementar. Por isso que Edson de Resende Castro (2010, p.132) afirma que “[...] a presença das primeiras e a ausência das segundas leva à elegibilidade, ou seja, ao direito de ir às urnas”.
Especificamente, no que tange às inelegibilidades em virtude do exercício de determinadas funções, que são incompatíveis com a condição de candidato, a Constituição da República estabeleceu a possibilidade de Lei Complementar fixar prazos e regulamentar essa matéria.
Editou-se, portanto, a Lei Complementar n.º 64/90 – que regulamentou o artigo 14, § 9º, da CR/88 -, que se preocupou em evitar que aquele que esteja exercendo determinadas funções previstas na lei se apresente em situação de maiores oportunidades diante dos demais concorrentes, ocasionando desequilíbrio do processo. Por isso que se exigiu nessas circunstâncias a desincompatibilização das funções públicas, que consiste no afastamento do cargo, emprego ou função públicos, de maneira a viabilizar a candidatura, desde que observado o prazo fixado no ordenamento jurídico, podendo esse afastamento ocorrer por simples licença (para os funcionários públicos efetivos), por exoneração (para os servidores ocupantes de cargo em comissão) e por renúncia (para os titulares de mandato eletivo).
No entanto, por força da Emenda Constitucional de n.º16/97, que alterou o § 5º, do art. 14, da CR/88, os chefes do Poder Executivo podem permanecer em seus cargos para disputar a reeleição, exigindo-se a desincompatibilização apenas para o caso de disputarem outro cargo.
Assim, se um Prefeito visa disputar, p.ex., o cargo de Deputado deverá afastar-se de sua função pelo menos 6 (seis) meses antes da data da eleição, pois dessa forma resolve-se o problema da incompatibilidade e, via de consequência, da inelegibilidade. Utilizando desse raciocínio, prefeitos municipais já por dois mandatos e que ainda pretendiam permanecer no poder, apesar da Constituição permitir apenas uma reeleição, se desincompatibilizavam de seus cargos para disputarem o cargo de prefeito de outro município, independentemente se vizinho ou não, sendo essa situação permitida pela jurisprudência eleitoral, que entendia essa manobra como candidatura a outro cargo.
Felizmente, desde 2008 o TSE, através do Respe n. 32.507, passou a entender que esses “prefeitos itinerantes” não podem disputar um terceiro mandato, ainda que em município diverso, sob o fundamento de que o princípio republicano não permite a perpetuação no poder.
A propósito:
RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. MUDANÇA DE DOMICÍLIO ELEITORAL. “PREFEITOS ITINERANTES”. EXERCÍCIO CONSECUTIVO DE MAIS DE DOIS MANDATOS DE CHEFIA DO EXECUTIVO EM MUNICÍPIOS DIFERENTES. IMPOSSIBILIDADE. INDEVIDA PERPETUAÇÃO NO PODER. OFENSA AOS §§ 5º E 6º DO ART. 14 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. NOVA JURISPRUDÊNCIA DO TSE. Não se pode, mediante a prática de ato normalmente lícito (mudança de domicílio eleitoral), alcançar finalidades incompatíveis com a Constituição: a perpetuação no poder e o apoderamento de unidades federadas para a formação de clãs políticos ou hegemonias familiares. O princípio republicano está a inspirar a seguinte interpretação basilar dos §§ 5º e 6º do art. 14 da Carta Política: somente é possível eleger-se para o cargo de “prefeito municipal” por duas consecutivas. Após isso, apenas permite-se, respeitando o prazo de desincompatibilização de 6 meses, a candidatura a “outro cargo”, ou seja, a mandato legislativo, ou aos cargos de Governador de Estado ou de Presidente da República; não mais de Prefeito Municipal, portanto. Nova orientação jurisprudencial do Tribunal Superior Eleitoral, firmada no Respe 32.507. (TSE, Respe n. 32.539, Rel. Min. Carlos Ayres Britto).
Importante registrar que os prazos da desincompatibilização variam de acordo com o risco de se atentar contra a isonomia de oportunidades entre os candidatos, estabelecendo a Carta Política e a Lei Complementar n. 64/90 o período compreendido entre três a seis meses de afastamento, observando sempre que a inelegibilidade só existe se o candidato exercer função tida como incompatível no território da disputa, vale dizer, a legislação não exige a desincompatibilização de um servidor público do município de Belo Horizonte que pretende se candidatar ao cargo de vereador no município de Formiga, diante da improvável interferência no eleitorado do local da eleição, em decorrência do cargo por ele ocupado.
Ademais, insta consignar que o prazo de afastamento dos servidores públicos, por serem remunerados, é sempre de 3 meses, independentemente do cargo eletivo em disputa, mesmo quando a hipótese se referir àquela prevista no art. 1º, VII, da LC n. 64/90, que prevê o prazo de desincompatibilização de 6 meses para a Câmara Municipal, com exceção dos servidores do fisco. Isso se justifica porque interpretação em contrário atentaria contra os princípios regentes da Administração Pública, pois com a redução do prazo para 3 meses, o servidor já terá sido escolhido em convenção, evitando, assim, o recebimento de licença remunerada, sem qualquer causa justificadora legítima ou razoável.
Portanto, caso um servidor público tenha interesse de se candidatar nas próximas eleições deverá se atentar para o prazo de desincompatibilização, sob pena de ter sua candidatura impugnada. No entanto, importante ressaltar que esse tipo de inelegibilidade, por se tratar de hipótese infraconstitucional, se submete ao instituto da preclusão se não for arguida por ocasião do registro da candidatura. Assim, se essa incompatibilidade não for suscitada no momento oportuno não mais poderá ser feita em outra ocasião. Por isso que a impugnação em tela, que poderá ser feita por qualquer candidato, partido político, coligação ou pelo Ministério Público, deverá ser utilizada com presteza, evitando que candidaturas ilegais possam ser registradas, a despeito do comando previsto na Lei Complementar de regência.
De mais a mais, sendo o Ministério Público Eleitoral uma instituição que tem como função jurisdicional, dentre outras, a defesa do regime democrático, certo é que seus membros têm legitimidade para oficiar em todos os processos e procedimentos em que se apresente a matéria eleitoral, intervindo tanto como autor ou como custos legis, ou seja, como fiscal da lei. Assim, qualquer interessado que porventura tenha conhecimento de alguma irregularidade no pleito eleitoral poderá se direcionar ao Ministério Público noticiando os fatos, para que o Promotor Eleitoral possa tomar as providências pertinentes, visando, sempre, a lisura e a igualdade de oportunidades na eleição.
Por fim, anotamos que o objetivo deste artigo foi fazer um breve panorama da inelegibilidade que tem como causa determinante o exercício de certas funções, que a lei infraconstitucional entende como incompatíveis com a condição de candidato, oportunidade em que demonstramos que essa situação se justifica pelos princípios norteadores do Direito Eleitoral, notadamente os do Estado Democrático de Direito e o da igualdade ou isonomia, garantindo, assim, aos cidadãos a liberdade e a plena participação na escolha de seus governantes, de sorte que a disputa eleitoral transcorra com as mesmas oportunidades entre os candidatos, pois, caso isso não ocorra, os legitimados eleitorais, dentre eles o Ministério Público, deverá provocar a Justiça Eleitoral para restabelecer o sistema jurídico. E não poderia ser de outra forma, pois apesar dos princípios serem infringidos até mesmo com certa frequência, essa situação não deve perdurar, até porque, como lecionado por José Jairo Gomes (2010, p.29), a infringência aos princípios [...] “é muito mais grave que a transgressão de uma regra positivada, pois a desatenção a um princípio implica ofensa não apenas a específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos, aos fundamentos em que a norma ou o próprio ordenamento encontram-se assentado”.
Por:
MARCO AURÉLIO RODRIGUES DE CARVALHO*
Promotor de Justiça do Estado de Minas Gerais e Promotor Eleitoral. Professor Universitário. Pós-Graduado em Direito Constitucional. Mestrando em Direito – Proteção de Direitos Fundamentais